Victory Square: Entre Memórias, Gritos e Gentrificação


 

Há músicas que a gente ouve e sente que, de algum jeito estranho e bonito, elas conseguem carregar no peito um pedaço inteiro de uma cidade. "Victory Square", da banda canadense The Dreadnoughts, é exatamente assim: um tributo apaixonado e melancólico à Vancouver de ontem e, talvez, um lamento pela Vancouver de hoje.

A primeira pancada emocional já vem no começo, com esses versos:

"Down at Victory Square, the soldiers stand at ease,
where the lovers stroll and the workers meet..."

Aqui, Victory Square surge como um lugar vivo, pulsante. Não é só uma praça — é um ponto de encontro, de memória, de luta. Dá pra quase ver as cenas se desenrolando: soldados que descansam, amantes que trocam olhares tímidos, trabalhadores discutindo seus sonhos e suas frustrações. Não parece apenas um cenário... parece um lar para todos que carregam histórias nas costas.

Mas — e aqui talvez esteja o nó na garganta — o tempo muda tudo. E nem sempre muda pra melhor. A música segue:

"And the ghosts of a thousand dreams
still whisper from the streetlights."

Quantos sonhos ficaram pelo caminho? Quantas esperanças ficaram soterradas sob prédios modernos e bares gourmetizados? A banda não responde diretamente. E talvez nem precise. A gente sente. Basta caminhar por uma cidade grande qualquer e ver quantos espaços antes populares se tornaram inabitáveis para quem os construiu com suor e música.

The Dreadnoughts têm esse dom raro de transformar a história urbana em poesia de três acordes. E o melhor: sem soar como um manifesto seco ou um tratado acadêmico. Há emoção, há verdade.

Em outro trecho, eles cantam:

"And the rich man laughs, and the poor man cries,
and the children dream of leaving."

É quase um soco. Rápido, direto. A desigualdade não é só uma estatística — é uma ferida aberta. Enquanto uns riem, outros choram. Enquanto uns desfrutam, outros sonham em ir embora. Não é difícil se identificar. Quem nunca olhou para sua cidade natal e se perguntou: "Será que ainda tem lugar pra mim aqui?"

Victory Square, então, vira um símbolo maior: representa qualquer lugar do mundo onde a memória popular tenta sobreviver contra a máquina impiedosa da especulação imobiliária, da gentrificação, do esquecimento.

E olha que bonito (e triste) esse outro trecho:

"All the songs we sang, all the dreams we had,
they’re buried here, beneath the pavement."

Dá vontade de parar e respirar fundo depois de ler isso, não dá? Não é só o chão de Victory Square que mudou — é a alma do lugar. As músicas, os sonhos, as vozes... tudo empurrado para debaixo do concreto novo e reluzente. Talvez seja isso que os The Dreadnoughts queiram nos lembrar: que progresso, sem memória, é só demolição.

A mistura perfeita de folk, punk e saudade

Vale lembrar que a sonoridade de "Victory Square" também carrega essa dualidade. A música tem aquele ritmo acelerado típico do folk punk — como se estivesse correndo para não ser apagada pelo tempo. É urgente e, ao mesmo tempo, profundamente nostálgica.

The Dreadnoughts bebem da fonte da música folk tradicional, mas com uma energia crua e rebelde do punk. Essa fusão musical dá ainda mais força à letra. É quase como se a banda dissesse: "A gente não vai esquecer. A gente vai berrar se for preciso."

Victory Square hoje: memória ou marketing?

Ironia ou tragédia: hoje, Victory Square, no centro de Vancouver, é cercada por prédios de luxo, cafés caros e novas tecnologias. Claro, a praça ainda é um memorial para soldados mortos em guerras. Mas o espírito popular que a música celebra parece, cada vez mais, uma fotografia desbotada no fundo da gaveta.

E aí fica aquela pergunta no ar (dessas que incomodam e não deixam a gente dormir fácil): será que, no fundo, todas as cidades estão destinadas a enterrar seus próprios sonhos sob o peso do lucro?

"Victory Square" não nos dá respostas. Mas faz a gente lembrar — e sentir — que há memórias que merecem ser protegidas, nem que seja à força da música e da saudade.





Referências Bibliográficas

  • THE DREADNOUGHTS. Victory Square. Álbum: Victory Square, 2009.
  • COHEN, Anthony P. The Symbolic Construction of Community. Routledge, 1985.
  • ZUKIN, Sharon. Naked City: The Death and Life of Authentic Urban Places. Oxford University Press, 2010.

Questões 

1. A música "Victory Square" é ambientada em qual cidade?
A) Toronto
B) Vancouver
C) Montreal
D) Ottawa

2. O que Victory Square simboliza na música?
A) Um centro tecnológico
B) Um espaço de luta, memória e resistência
C) Um campo de batalha contemporâneo
D) Um shopping center

3. Qual estilo musical mistura-se na sonoridade da música?
A) Jazz e samba
B) Reggae e pop
C) Folk e punk
D) Blues e country

4. Segundo a música, o que acontece com os sonhos antigos?
A) São celebrados
B) São enterrados sob o concreto
C) São atualizados com novas tecnologias
D) São esquecidos apenas em músicas

5. O tom da música pode ser descrito como:
A) Otimista e festivo
B) Cético e revoltado
C) Melancólico e nostálgico
D) Neutro e acadêmico

6. A gentrificação, tema implícito na música, refere-se:
A) À revitalização cultural dos bairros
B) À substituição de classes populares por classes mais ricas
C) À preservação histórica de praças
D) À instalação de museus históricos

7. Qual é o impacto da modernização na visão transmitida pela música?
A) Melhora a vida dos antigos moradores
B) Apaga memórias coletivas e aumenta desigualdades
C) Facilita a circulação de culturas locais
D) Incentiva a luta trabalhista

8. Quando foi lançado o álbum Victory Square?
A) 2007
B) 2008
C) 2009
D) 2010

9. O estilo de letra da música "Victory Square" pode ser classificado como:
A) Técnico e descritivo
B) Poético e emotivo
C) Didático e neutro
D) Cômico e irônico

10. A expressão "ghosts of a thousand dreams" (fantasmas de mil sonhos) sugere:
A) A presença de tradições indígenas
B) A continuidade dos projetos sociais
C) O esquecimento de antigos sonhos e esperanças
D) A violência entre diferentes classes sociais


Gabarito Comentado

  1. B (A música fala de Vancouver, especialmente do bairro Victory Square.)
  2. B (Victory Square é descrita como local de memória e resistência.)
  3. C (Folk punk é a mistura que caracteriza a sonoridade.)
  4. B (Os sonhos são enterrados sob o concreto, como na metáfora da música.)
  5. C (O tom é melancólico e nostálgico, embora também rebelde.)
  6. B (Gentrificação é a substituição de classes populares.)
  7. B (O impacto é negativo para a memória popular.)
  8. C (O álbum foi lançado em 2009.)
  9. B (A letra é carregada de emoção e poesia.)
  10. C ("Fantasmas de mil sonhos" se refere a esperanças apagadas.)


Eduardo Fernando

Prof. Eduardo Fernando é Mestre em Educação pela Must University, especialista em Metodologias de Ensino Superior e Educação a Distância. Possui formação em Geografia pela Universidade Norte Do Paraná e Pedagogia pela Universidade Católica de Brasília.

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